Luísa Sonza e a família vizinha 435g2y
Cantora escancara traição do namorado em rede nacional, enquanto Shannon Watts, morta em 2018, sempre fez da vida uma exposição; o quanto isso é saudável e prejudicial? 2j6p6s
A traição, com certeza, é um dos maiores horrores que uma pessoa enfrenta. Ter a confiança quebrada, os sonhos de união destruídos e, principalmente, saber que aquela pessoa com quem convive, com quem divide a intimidade tem uma outra vida causa dores consideráveis.

Cada um lida com esse sofrimento de uma forma.
A cantora Luísa Sonza, a exemplo do que fizeram recentemente Shakira e Miley Cyrus, resolveu expor o traidor publicamente.
Uma verdadeira ojeriza surgiu nas redes sociais e nas rodas de conversa de todo o Brasil.
E ei a procurar, em meus arquivos mentais, algum filme ou série que trouxessem o tema da traição.
E me veio na lembrança Cenas de um Homicídio – Uma família vizinha, da Netflix.
O documentário de true crime (crimes reais), produzido em 2020, tem uma hora e 23 minutos de duração. E mostra, infelizmente, que a vítima, Shanann Watts, apesar de expor completamente sua vida nas redes sociais, não conseguiu fazer o que as mulheres de hoje fazem.
Shannon morreu em 13 de agosto de 2018, antes de conseguir contar para o mundo que vinha sendo traída pelo seu marido, Chris Watts.
Detalhe: ela estava grávida do terceiro filho deles.
O documentário é incrível. Toda narrativa é contada pela própria Shannan, em vídeos recuperados das redes sociais e de arquivos visuais da polícia, com depoimentos de testemunhas e de Chris, incluindo os interrogatórios e as entrevistas dele para que as pessoas os ajudassem a localizar a amada esposa e as adoráveis filhas.
Shanann, uma dona de casa que trabalhava em home office com venda de produtos, era obcecada por compartilhar sua família perfeita com os seguidores.
Ela mostrava o que fazia de jantar. E o quanto Chris era o marido ideal. Ela cozinhava, ele lavava a louça. E não se importava em aparecer, de fundo, nas gravações da mulher, sempre sorrindo e se mostrando um sujeito muito legal.
Calmo, ele tem vários vídeos interagindo com as filhas Bella, de 4 anos, e Celleste, de 3.
Trabalhador, Chris era o tipo de cara que dividia a vida apenas com o serviço e a família.
Até que ele resolveu encaixar os exercícios físicos nessa rotina.
O sobrepeso foi embora, trazendo, ao modesto trabalhador, um corpo de atleta.
Enquanto isso, Shanann engordava.
Numa das cenas do documentário, ela aparece com uma camisa escrita em inglês:
– Opa! Fizemos de novo.
Uma alusão a uma música famosa de Britney Spears para avisar ao marido – em uma cerimônia compartilhada pela internet – que eles seriam pais de Nico, o primeiro menino da família.
A reação de Chris já demonstra que havia algo errado.
Poderia ser a timidez de um momento tão íntimo estar sendo exposto. Ou pior. Sim. Era o pior.
O marido perfeito, o pai exemplar, estava saindo com uma outra mulher.
E nem se esforçou para esconder.
Numa viagem da esposa, ele levou a amante para jantar fora e pagou com o cartão de crédito usado em conjunto com Shanann.
Ou ele estaria com muita fome ou pagou para duas pessoas.
Foi a conclusão de Shanann.
O mundo dela estava desmoronando.
Lidando com uma doença autoimune – também devidamente explorada em seus vídeos – ela tenta, desesperadamente, manter o casamento.
Mas Chris tinha outros planos.
O que ele faz é algo surreal para um ser humano. Algo impensável de um pai. Algo, infelizmente, nada raro em relacionamentos amorosos deteriorados.
Shanann deveria ter exposto o marido? Acabado com sua reputação de bom moço nas redes sociais?
Mas tudo era apenas uma suspeita. Como destruir o conto de fadas compartilhado com milhares de pessoas?
Talvez, se tivesse feito o que Sonza fez, ainda estaria viva.
Chris não teria como matar a esposa sabendo que todo mundo estava de olho nele.
Sem que a opinião pública, os círculos de amizade e os parentes soubessem o que o casal realmente vivia, ficou mais fácil para Chris achar que poderia se livrar da mulher sem que as suspeitas recaíssem sobre ele.
E foi tanta a confiança que não se contentou em acabar apenas da esposa grávida.
A desconfiança dos vizinhos, o trabalho da polícia investigativa, tudo é mostrado da forma como ocorreu. Não há simulações, reproduções, atores e atrizes. O documentário mostra as reações reais dos personagens envolvidos. A amante, o pai de Chris. O assassino. A família desmoronada das vítimas.
Um desfecho chocante.
Um desses absurdos que mostram, mais uma vez, o que eu sempre digo: o terror está no ser humano.
Está no egoísmo. Está na falta de empatia.
Ninguém é obrigado a conviver com quem não mais se sente confortável. Sejam anos de relacionamento ou meses de namoro.
O peso da exposição dificulta essa aceitação?
É mais difícil prestar contas de um término de relacionamento quando há zilhões de pessoas torcendo para que dê certo? E, na verdade, usando-o como exemplo a ser seguido?
Ah! Eles são perfeitos um para o outro. Desta vez, ela achou o cara ideal. Ela é a mulher para colocá-lo na linha.
Pressões desnecessárias que podem acabar com atitudes irracionais como a de Chris.
Ou render muito engajamento como no caso das cantoras traídas.
Que esses episódios nunca mais precisem estar documentados no gênero true crime.