Lei existe, mas casas de proteção às 'Sophias' não saem do papel 2fn6g
Criada em 2022, a lei Henry Borel traça uma série de medidas para garantir a proteção de crianças e adolescentes vítimas de maus-tratos, mas, pouco tem sido notado na prática jq3w
A morte da menina Sophia, de 2 anos, em Campo Grande, reacendeu a discussão sobre as falhas na rede de assistência e proteção às crianças e adolescentes em risco de violência. O Brasil já tem uma lei que, em tese, cria mecanismos de prevenção e o enfrentamento da violência doméstica e familiar. É a lei Henry Borel, que homenageia o menino agredido até a morte pelo padrasto o então vereador Jairo Souza Santos Junior, o Jairinho, em 2021.

A regulamentação federal prevê, dentre outros aspectos, a criação de centros de atendimento integral às crianças vítimas de maus-tratos, com atendimento semelhante ao prestado na Casa da Mulher Brasileira, em Campo Grande. A realidade, no entanto, ainda está longe de corresponder com os parâmetros da lei.
Em Campo Grande, não há previsão para a construção de um centro nestes moldes, mas a DGPC (Delegacia Geral da Polícia Civil) adianta que estuda ampliar o atendimento na Depca (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente).
A delegacia já funciona em uma nova sede, mais moderna e ampla, com “toda estrutura necessária para o atendimento a crianças e adolescentes”, informa a Polícia Civil. O órgão de segurança defende que “todas delegacias que funcionam 24h estão preparadas e capacitadas para realizarem todo e qualquer atendimento, incluindo a crianças e adolescentes, de forma célere e humana” em Campo Grande.
Todo esse preparo, entretanto, não foi o suficiente para que os suspeitos de agredir Sophia fossem identificados e punidos, antes do pior. A Polícia Civil soube dos maus-tratos sofridos pela menina. Foram dois boletins de ocorrência, um deles de quando ela teve fratura na tíbia.
O Conselho Tutelar também já havia sido acionado. Nada resolveu.
Até sindicância foi aberta na rede municipal de saúde, para apurar se houve negligência no atendimento à menina, que esteve inúmeras vezes nos postos de saúde de Campo Grande, antes de ser morta.
Ex-delegado titular da DEPCA, Paulo Sérgio Laureto, é um dos defensores da criação de uma Casa da Criança com atendimento integral aos pequenos vítimas de agressão e maus-tratos. Foram cinco anos à frente da delegacia, um ciclo que se encerrou em 2018.
“Desde aquela época, nós lutamos por essa ideia, criar um local onde haveria todos os integrantes da rede de proteção à criança atendendo simultaneamente, cada um em sua atribuição para melhorar o atendimento a essas crianças. Tivemos várias reuniões com a Vara da Infância, Conselho, porém, essa luta eu não consegui vencer”, desabafa o delegado, que hoje está aposentado.
Laureto lembra que uma das maiores dificuldades que encontrou quando assumiu a delegacia, foi a falta de um setor psicossocial na unidade policial.
“A delegacia não tinha um núcleo psicossocial com profissionais adequados para ouvirem aquelas crianças vítimas de violência, então, tivemos de trabalhar na revitalização do setor psicossocial”, comenta.
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Hoje a DEPCA é referência nesse tipo de atendimento em Mato Grosso do Sul. Outro problema apontado por Laureto persiste até hoje e diz respeito ao ruído entre as funções da polícia e do Conselho Tutelar.
Campo Grande tem apenas cinco conselhos tutelares, quantidade considerada insuficiente para atender a demanda de uma capital com quase um milhão de moradores. Campo Grande também não tem o serviço de escuta especializada, que é formado por uma equipe capacitada para ouvir e acolher a criança no local dos maus-tratos, o quanto antes, sem a necessidade de levá-la a delegacia. Sem este atendimento, o serviço na delegacia fica congestionado.
A criação de um centro integrado de proteção à criança permitiria que a interlocução entre os órgãos da rede fosse mais efetiva, segundo Laureto.
“São engrenagens que estão funcionando autonomamente, não estão interagindo de forma integrada como deveriam funcionar”, diz o ex-delegado, sobre o aparentemente descomo que existe entre os órgãos de proteção à criança.
Se houve omissão, falha ou inércia dos órgãos que deveriam proteger Sophia, ainda não se sabe. Mas, diante da dúvida, a Justiça, polícia, Conselho Tutelar, OAB (Ordem dos Advogados), representantes da educação dentre outros órgãos da rede de proteção, se comprometeram a criar um protocolo único de atendimento às crianças e adolescentes vítimas de maus tratos e abusos, durante reunião, nesta última sexta-feira (3) no MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul).
O caso Sophia 4l6h3l
Na noite do dia 26 de janeiro, a pequena Sophia, de 2 anos, chegou morta na Upa (Unidade de Pronto Atendimento) do Bairro Coronel Antonino, com sinais de maus-tratos e suspeita de estupro. A suspeitas foram confirmadas em laudo, divulgado nesta sexta-feira (3). Stephanie de Jesus da Silva, de 24 anos, e Christian Campoçano Leithein, de 25, mãe e padrasto da menina estão presos pelo crime.