Em áudio, presidente da Funai promete amparo a servidor acusado de arrendar Terra Indígena 2w2664
Marcelo Xavier diz que tomará providências para ajudar coordenador regional da Funai em MT 12t4b
Um áudio interceptado pela Polícia Federal releva que o presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio), Marcelo Xavier, prometeu amparo a Jussielson Silva, quando ele era coordenador do órgão federal em Ribeirão Cascalheira, a 893 km de Cuiabá, acusado de arrendar áreas na Terra Indígena Marãiwatsédé ilegalmente.

Silva, que é ex-policial militar, o sargento da Polícia Militar Gerrard Maxmiliano Rodrigues de Souza e o ex-PM Enoque Bento de Souza, foram presos pela PF em março, durante a operação Res Capta. O grupo é suspeito de conceder, mediante pagamento, terras em Marãiwatsédé a produtores rurais para criação de gado.
No áudio, interceptado em 18 de fevereiro deste ano, Jussielson se mostra preocupado, já que a PF tinha lhe procurado para obter informações sobre arrendamentos de terras. Durante a ligação, Marcelo Xavier diz que “vai dar ciência já do caso ao corregedor de Mato Grosso, ao corregedor nacional da Polícia Federal” e tenta acalmar o servidor, dizendo que ele “pode ficar tranquilo”.
A gravação foi anexada a um relatório da PF sobre a investigação e aponta que o presidente da Funai deu “sustentação à ilegalidade” do servidor no estado.
Arrendamento ilegal 5x696
A área tem cerca de 165 mil campos de futebol espalhados em três municípios de Mato Grosso e abriga cerca quase 800 indígenas xavantes, de acordo com o ISA (Instituto Socioambiental).
A investigação começou em 2021, depois que a PF recebeu denúncia de que servidores da Funai de Ribeirão Cascalheira estariam recebendo propina para arrendar terras da Marãiwatsédé a fazendeiros. Entretanto, o esquema estaria ocorrendo desde 2017.
Naquela época, o valor cobrado pela propina era de R$ 8 por cabeça de gado. Até o começo deste ano, eram cobrados R$ 30 por animal, conforme apuração da PF.
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O cacique Damião, presidente da Associação Boiu Marãiwatsédé, foi também apontado como ator importante no suposto esquema. Ele fazia as operações com o coordenador da Funai. O levantamento da PF aponta que um dos arrendatários depositaram na conta do cacique, entre abril e outubro de 2021, R$ 317 mil. O cacique foi denunciado.
Ainda outro fazendeiro teria feito depósitos que somaram R$ 80,4 mil entre fevereiro e novembro do ano ado. O cacique prestou depoimento à PF em Barra do Garças e foi liberado. Já Jussielson foi preso.
O relatório da PF conclui pelo indiciamento de Jussielson Silva, Gerard Maxmiliano Rodrigues e Enoque Bento de Souza.
Denúncias 573s31
A primeira denúncia do caso foi feita pelo Ministério Público Federal em abril e aceita pela Justiça Federal, tornando Jussielson, Gerard e Enoque réus por integrar milícia privada, sequestro qualificado, abuso de autoridade, peculato, favorecimento pessoal, usurpação de função pública na forma qualificada, porte ilegal de arma de fogo e estelionato.
Em agosto, o MPF ofereceu novas denúncias contra 27 pessoas, também referentes à Operação Res Capta, por corrupção iva e ativa majoradas, associação criminosa e crimes ambientais. O órgão pediu a perda de bens conseguidos de forma ilegal, suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o poder público por, no mínimo, oito anos. O Primeira Página não conseguiu confirmar se essas denúncias já foram aceitas pela Justiça.
O MPF quantificou o dano obtido pela multiplicação da área ocupada por arrendatário declarada em depoimento pelo montante de R$ 11.917,76. O montante total da reparação buscada na ação civil pública é de R$ 667.235.933,40.
Outro lado 1o5c4
A reportagem do Primeira Página procurou a defesa de Jussielson Silva também foi procurada, mas preferiu não se manifestar.
Por meio de nota, a Funai disse que mantém à disposição das autoridades policiais para colaborar com as investigações e que o funcionário investigado foi exonerado do cargo em março de 2022. Falou ainda que desde 2018 busca uma solução para o ime envolvendo arrendamentos em Marãiwatsédé.
Veja a íntegra da nota da Funai:
“A Fundação Nacional do Índio (Funai) esclarece que, desde 2018, busca uma solução para o ime envolvendo a prática de arrendamento na Terra Indígena Maraiwatsede, localizada no Mato Grosso, em diálogo constante com o Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal sobre o tema.
Nesse sentido, cumpre destacar que o arrendamento de terras indígenas é vedado pela Constituição Federal de 1988 e que a Funai não coaduna com nenhuma conduta ilícita, tendo sua atuação pautada na legalidade, transparência, segurança jurídica, pacificação de conflitos e autonomia dos indígenas. Sendo assim, a Fundação vem trabalhando em um modelo de transição que permita superar o quadro ilegal existente na Terra Indígena Maraiwatsede, mediante reuniões com o MPF e acionando a Polícia Federal nas situações cabíveis.
Em face de tais assuntos e para tratar de soluções na construção de um potencial Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), a Assessoria da Presidência da Funai participou de reunião com o procurador da República em Barra do Garças (MT), Everton Pereira Aguiar Araújo, em 3 de novembro da 2021. Tendo em vista o contexto da pandemia da covid-19, a Funai priorizou as ações voltadas à segurança alimentar dos indígenas, com a entrega de cestas básicas em aldeias de Norte da Sul do país, na perspectiva de retomar as discussões acerca do TAC assim que o contexto sanitário permitisse.
Já o “Relatório de Levantamento de Dados do Território Marãiwatsédé”, de 28 de junho de 2021, elaborado pela Coordenação Regional da Funai em Ribeirão Cascalheira (MT), foi encaminhado pela Presidência da Funai ao Departamento de Polícia Federal, por meio do Ofício nº 1404/2021/PRES/FUNAI, de 17 de setembro de 2021, e, também ao procurador da República de Barra do Garças (MT), Everton Pereira Aguiar Araújo, por meio do Ofício nº 1478/2021/PRES/FUNAI, de 21 de outubro de 2021, o que demonstra a preocupação da Funai com a aparente situação de irregularidade naquela Terra Indígena, colaborando, assim, com as autoridades competentes no esclarecimento do caso. Não menos importante destacar que as ações da Funai aparentemente precederam qualquer denúncia usada como fato motivador para o desencadeamento da Operação Res Capta da Polícia Federal.
Tal relatório indica, por exemplo, que a prática do arrendamento gerava concentração de renda por parte do Cacique Damião, com coação dos demais indígenas, impedindo inclusive que fosse realizada atividade de fiscalização pela Funai. “Foi constatado também que as lideranças indígenas de T.I. Marãiwatsédé possuem quantidade considerável de armamento ilegal de calibre permitido. Dentre elas 04 espingardas no calibre 12, em média 10 pistolas semiautomáticas, modelo Glock G17 no calibre 9x19mm, vários revólveres no calibre 38, Carabinas de calibre 38 e 22”, aponta o documento. Causou estranheza, porém, que não se teve notícia de mandado de busca e apreensão à época para a apreensão deste potencial armamento.
Cabe ressaltar que a Coordenação Regional em Ribeirão Cascalheira (MT) é Unidade Gestora, com autonomia para firmar contratos, realizar licitações e propor indicações para as nomeações. A fundação esclarece também que se mantém à disposição das autoridades policiais para colaborar com as investigações e que o funcionário investigado foi exonerado do cargo em março de 2022″.