Como um rio morre? Os rios em MT correm risco? O Primeira Página responde 4q146f

Segundo especialista, dois rios estão em estado crítico: o Coxipó, na região metropolitana de Cuiabá e o Bento Gomes, em Poconé. Outro destaque é o córrego Queima Pé, que atende a população de Tangará da Serra 5e4s3x

Sim, um rio pode morrer, e há pelo menos três em Mato Grosso que correm esse risco. Especialistas explicam que, para chegar a esse ponto, é necessário que várias alterações aconteçam na paisagem ao redor que acabam influenciando no rio, considerado um sistema aberto. 

Ibraim Fantim fala sobre rios de MT que estão em risco

Redução da vazão: um sinal de alerta 2n6t6o

Doutor em Ecologia de Ambientes Aquáticos e professor da UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso), Dilermando Lima Junior explica que quando se fala nas influências sobre os rios do Planalto Central, como da região Araguaia, os principais fatores que podem estar alterando o regime da vazão, ou seja, na quantidade de água, é a mudança do uso do solo. 

“Quando você substitui o Cerrado por uma vegetação, por uma plantação, você perde um serviço ambiente muito importante que o bioma faz, que é fazer com que a água que cai da chuva penetre e reabasteça os lençóis freáticos. E são esses lençóis freáticos que recarregam os rios na época da seca”, disse.

Outro fator importante na mudança do uso do solo, segundo o professor, é a agricultura, que também aumenta a pressão sobre os rios.  

“Quando você faz uma irrigação pelo rio, é o caso, por exemplo, no Araguaia, avançando muito, você tira aquela água num momento crítico para o rio, como no período de seca e joga para as plantações. Então, menos água vai estar disponível. Quando você aumenta muito a irrigação por meio de um rio, de menor vazão, pode secar o rio”.   

Como um rio morre?
Segundo especialista, ações conjuntas diminuem quantidade de água em um rio. (Foto: Arquivo pessoal Ibraim Fantim)

Nesse sentido, são ações conjuntas que atuam para diminuir a quantidade de água disponível em um rio, que pode chegar a secar. Inclusive, o professor revela que dados atuais já mostram uma grande redução na vazão dos rios no estado.  

“Seja na seca, ou na cheia, rios que eram perenes, que corriam durante todo o ano, aram a ficar mais secos. Na bacia do Araguaia, desde a década de 1970 até 2019, há uma clara redução da vazão. No Planalto Central, temos aumento da temperatura, diminuição das chuvas, e isso já está sendo sentido com dados atuais. Dados mostram que no Araguaia esse padrão de redução é muito claro”.  

Impacto das hidrelétricas e PCHs  4b3q4b

Outro fator apontado pelo especialista que causa grande impacto nos rios é a construção de barragens. Como exemplo, citou o caso do Rio Cuiabá, onde a construção de UHEs (usinas hidrelétricas) e PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas) chegou a ser debatida, mas que agora está proibida por lei em toda a sua extensão.  

“É um verdadeiro absurdo, em termos técnicos, você mata o rio também. Quando você constroem hidrelétrica, homogeneíza o fluxo, corta as rotas migratórias, e também mata o rio. Você tem o rio bonitinho, mas a biota aquática não existe mais ali. Os grandes peixes migradores, como o pintado, dourado, eles somem desses ambientes”, ressaltou.  

Rios de MT em risco  6my22

Doutor em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental e professor da UFMT (Universidade Federal e Mato Grosso), Ibraim Fantim aponta três casos preocupantes no Estado: o Rio Coxipó, na região metropolitana de Cuiabá, o Rio Bento Gomes, em Poconé, e o córrego Queima-Pé, que atende a população de Tangará da Serra.  

“Os três são casos críticos e que precisam ter uma atenção maior pelo poder público, pelos gestores em relação à disponibilidade hídrica e à segurança de água para a população”, disse o especialista.

Rio Coxipó  1t621g

Apesar de garantir o abastecimento de 30% do que é consumido em Cuiabá, o especialista afirma que o Rio Coxipó não tem a atenção necessária, sendo importante olhar para ele de forma diferente e mais estratégica.  

Como morre um rio?

“Ele recebe um impacto urbano muito grande ao ar pela área urbana de Cuiabá. Isso em termos de poluição, sem falar em condomínios que estão surgindo no seu entorno, nas suas margens, onde o uso da terra, que tem um solo frágil, com alta suscetibilidade de erosão, está se expandindo sem um devido controle ambiental, para com o sistema hídrico”.   

O especialista ainda ressalta que outra preocupação é a cabeceira da bacia, que fica em Chapada dos Guimarães, que praticamente secou no último ano.  

“A vazão era tão pequena que acharam que tinha secado. Isso é um problema que a gente não tinha registro antes, os mananciais, as nascentes do Rio Coxipó secarem. E a gente viu isso não só aqui, mas também nas nascentes do Rio Cuiabá, córregos que nunca haviam secado na parte alta de Rosário do Oeste, Nobres, de rios que nunca tiveram registro de seca, tiveram”. 

Nesse sentido, o especialista faz um alerta e enfatiza que é necessário olhar com mais cuidado para o Rio Coxipó, desde a nascente até a confluência com o Rio Cuiabá, especialmente na área urbana, devido à poluição.  

“Vamos usar aqui? Claro, o benefício ambiental é importante, mas que tipo de ações de controle nós podemos fazer nos loteamentos que são próximos ao Rio Coxipó para evitar esse aporte, essa contaminação, esse lançamento de efluentes?”, questiona.  

Rio Bento Gomes 5nz1k

O especialista cita que o rio, que fica em Poconé, é um caso especial que causa preocupação.  

“Ele não tem uma nascente, como os outros rios, na parte alta. O Rio Bento Gomes é como se fosse uma grande lagoa de acumulação. Ele tem aquela parte baixa e a água de chuva entra ali e fica acumulada ali.  Então, não tem a manutenção do Rio Bento Gomes, a contribuição subterrânea é pequena, o que faz com que o rio seja, em alguns pontos, intermitente”, explica Fantim.

Outro problema levantado pelo especialista é o ponto de captação do rio, que na avaliação dele, foi instalado em um local que não é o mais adequado.  

“É um ponto que é intermitente. E a população acaba, recorrentemente, tendo o comprometimento da disponibilidade hídrica. Aí a prefeitura tem que fazer ações emergenciais para atender a demanda”.   

Mas essas não são as únicas preocupações. Historicamente, a região é uma área de garimpo, por isso, existem dúvidas quanto ao tipo de elemento existente na água.  

“A gente busca parceiros para que possamos analisar a ocorrência de metais pesados. Apesar das novas atividades de mineração terem controle rígido sobre mercúrio, e as pregressas? O que nós temos sobre isso? Será que ainda tem? Será que ainda é um risco? Isso é um ponto que ainda nos cabe a investigar”.   

Queima-Pé   4q311m

Com 107.631 mil habitantes, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), Tangará da Serra, uma das maiores cidades de Mato Grosso, tem a captação de água localizada em uma microbacia do Rio Queima-Pé.  

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“A bacia está rodeada por áreas agricultáveis, sem a devida proteção, e com o aumento da demanda, variabilidade climática, a cidade tem enfrentado, frequentemente, problemas de disponibilidade hídrica, de água”.   

O especialista afirma que uma equipe dele já atua no local, levantando as demandas, e que a prefeitura tenta buscar soluções para resolver o problema de falta de água no município. “Está em fase de implementação a captação do Rio Sepotuba, que é um manancial de médio porte, mais próximo da cidade, a cerca de 13 km”.   

Mas, o especialista ainda lembra da importância de ações no entorno da bacia. Inclusive, as que já foram implementadas e já surtiram efeitos.  

“Resultados interessantes estão acontecendo, que é a proteção da bacia hidrográfica. Então, ações de proteção surtem efeitos diretos. Só que as pessoas têm memória curta ou não têm a percepção adequada. Então, sempre há o monitoramento e as informações científicas são importantes para comprovar”.

E o Rio Cuiabá?   4794c

Como um rio morre?
Rio Cuiabá já tem a ocorrência de remédios na água. (Foto: Divulgação | Prefeitura de Cuiabá)

Responsável por um projeto que estuda o Pantanal e os rios da região, cujo objetivo é incluir novos parâmetros para que seja possível entender o que realmente tem disponível para uso, Ibraim Fantim explica que, quando pensamos em escassez de água, é necessário olhar também outros aspectos. 

“A gente sempre lembra da quantidade, tem água ou não? Mas, temos que olhar também a qualidade da água. Outra coisa é às vezes você ter água com qualidade, quantidade, mas você não ter o a ela. Então, associado à parte de quantificação das águas, nós também fazemos no projeto o levantamento dos usos das águas da bacia”, explicou. 

O professor frisa que, no Rio Cuiabá, um ponto que já tem chamado a atenção é a ocorrência de remédios na água.  

“Nós temos ibuprofeno, cafeína, hormônios, antibióticos. Então, muitos medicamentos a gente está tomando por meio do consumo de água e, muitas vezes, nós nem sabemos. É claro que por serem elementos muitos novos ainda na literatura, ainda não se tem uma normatização que fala qual é a concentração segura que a gente pode ter contato. Mas, a gente já precisa ter registro dessas informações para que num futuro, a gente possa saber”. 

Especialista Ibraim Fantim fala sobre rios em MT

O professor ressalta que a situação é preocupante e que os dados do estudo, que está em andamento, serão importantes para que se possa tomar algum tipo de ação para lidar com esse novo cenário.

O volume de água do Rio Cuiabá    55383j

Sobre esse aspecto, o professor lembra que o Rio Cuiabá tem um aspecto diferente dos demais em Mato Grosso, que é a barragem do Manso, na região de Chapada dos Guimarães. A barragem é de regulação, ou seja, consegue armazenar água do período chuvoso e usar no período da seca. 

“Esse fato aumenta a disponibilidade hídrica do Rio Cuiabá no período de seca. Ela amortece nas grandes cheias. Inclusive, ela foi concebida com isso, para evitar as cheias na área metropolitana de Cuiabá. Então, ela armazena grandes chuvas, guarda essa água e depois vai soltando ao longo do ano e aproveitando para geração de energia”, explicou.   

Como um rio morre?
Professor Ibraim Fantim da UFMT lidera grupo que estuda impactos no Rio Cuiabá. (Foto: Arquivo pessoal Ibraim Fantim)

Mas, ressalta que a barragem trouxe também outra mudança, pois as grandes cheias que ocorriam no Pantanal já não acontecem mais, já que a estrutura está segurando esse volume de água.  

Como garantir a segurança dos rios?   4a1d53

Para o professor Dilermando Lima Junior, o primeiro o é melhorar a legislação, que precisa estar baseada em dados científicos, e que ela seja, de fato, aplicada. Além disso, garantir a recuperação ambiental e a proteção de nascentes e matas ciliares, que garantem a integralidade dos rios.  

Dilermando Lima Junior fala sobre importância da mudança na legislação para proteger os rios

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