Tradição e cultura: conheça 10 lendas populares da baixada cuiabana d4m2m
Apesar de alguns mitos de Mato Grosso possuírem semelhanças com lendas folclóricas nacionais, a cultura da região escancara os fortes laços com o povo ribeirinho 2o3sp
“Você sabe o que é folclore? Vou lhe dar a explicação. É tudo aquilo que vem do povo
e nasce livre do coração”. Cantando um trecho da paródia infantil, criada em cima do ritmo de Asa Branca de Luiz Gonzaga, Dorotéia da Costa, de 76 anos, se recorda dos contos antigos do estado, contados pelo avô.

Natural de Poconé e moradora de Cuiabá há 23 anos, ela conta as histórias que já ouviu.
“Essas lendas eram aquelas pessoas antigas que contavam. Meu avô falava que existia o lobisomem, a Mãe D’água, o Minhocão do Pari, a Mula sem Cabeça. Eles contavam essas histórias, mas acreditar é outra história”, disse.
Apesar de alguns mitos de Mato Grosso possuírem semelhanças com contos folclóricos conhecidos a nível nacional, a cultura da região escancara os laços fortes e inquebráveis com o ribeirinho, como a dança siriri e cururu, o artesanato de barro e a comida à base de peixe.
A vendedora autônoma, Suely Maria de Paiva, de 58 anos, gosta de rear essas tradições e histórias aos mais novos e diz que isso traz nostalgia.
“Eu gostava quando meu pai contava pra mim e meu netinho de 4 anos adora escutar, aí fico lembrando. A maioria são histórias de terror”, conta Suely.

Na capital onde, em seus 303 anos de história, ainda se cultiva em alguns bairros o velho hábito de se sentar em frente a porta da rua de casa para jogar conversa fora, eram nas calçadas que as lendas e crendices populares se espalhavam entre os moradores.
Porém, é possível ver que hoje, a medida em que a cidade hospitaleira cresce, muitas lendas regionais estão caindo no esquecimento.
Para ajudá-lo a relembrar algumas, o Primeira Página foi em busca dessas histórias. Após uma volta pelo centro de Cuiabá, as respostas foram encontradas dentro da Biblioteca Pública, do Museu do Palácio da Instrução.
Confira 10 lendas cuiabanas muito conhecidas 292j2z
Nós separamos para você 10 contos muito conhecidos na baixada cuiabana.
A maioria deles tem como base o livro “Retratos dos Seres da Noite”. A obra reúne mais de 20 histórias mato-grossenses, pesquisadas, selecionadas e redigidas pela historiadora, especialista em Gestão Cultural, Doralice Assis, ex-servidora da Secel de MT que morreu por covid em 2020.

Ilustradas pela artista Marlene Kirchesch, as lendas e crendices apresentadas no livro – estudadas por anos pelos docentes Rubens de Mendonça, Emilio Antunes, Francisco Ferreira Mendes, Erotides Milihome, Dunga Rodrigues – ressaltam a mistura entre o sobrenatural, com a religiosidade e simplicidade do povo que ajudou a construir e erguer essas terras anos atrás.
1. Minhocão do Pari 4v5645
Acima do porto da capital, no Rio Cuiabá, existe um sítio denominado Pari. A água do rio naquele trecho, corre muito forte e tem muitos poços que formam rebojos. Diz a lenda que em um desses poços mora o Minhocão do Pari, uma grande serpente que em épocas remotas, diziam que atraía casais de namorados, pescadores e banhistas para o fundo das águas para morrerem afogados.
Vários canoeiros que já navegaram pela região afirmam já terem visto a fera, segundo relatos, um animal de mais de 20 metros de comprimento e dois medo de diâmetro

Uma das conversas de pescadores que ajudou a espalhar a história, conta a história de uma linda moça que apaixonou-se por um pobre pescador, porém o pai a obrigou a se casar com um poderoso compadre.
Na noite do casamento, vestida de noiva, ela foi até o rio despedir-se do seu amado. Inconformados com a situação, os dois resolveram fugir pelas águas do Rio Cuiabá. O pai, orgulhoso demais para aceitar ficar desmoralizado diante dos parentes e amigos, saiu espalhando por aí que a filha foi engolida pelo Minhocão do Pari.
2. Troá Troá 717166
Existem várias versões conhecidas sobre o Troá. No livro “Retratos dos Seres da Noite” ele é descrito como um tronco de árvore velha, aveludado e desgalhado, que durante a madrugada, de 00h em diante, se arrasta pela escuridão das matas provocando um sinistro ruído: “troá troá troá”
Diz a lenda que quando um casal de viúvos se casa, após a morte a mulher vira um Troá.

Muitas pessoas de Mato-Grosso contam que já escutaram o roncar de um Troá de madrugada, principalmente em noites de sexta-feira, quando ficam mais agitados. Alguns relatos dizem que o silêncio da natureza, durante os momentos que antecedem e vem em seguida dos gritos é de arrepiar a espinha.
Existe também uma versão da história que retrata esse ser como um guardião da floresta: um homem baixo e muito peludo que carrega um grande galho, utilizado como arma para proteger a floresta de caçadores e malfeitores.
3. O Muro Arrombado do Quilombo 1l46z
Quando o Bairro Quilombo ainda tinha as características de origem, em um certo ponto mais afastado, havia um muro com uma parte arrombada, onde o matagal crescia e encobria restos de taipas socadas.
Durante as cheias, as águas nesse bairro eram abundantes, mas na seca, lavadeiras e engomadeiras precisavam fazer longas caminhadas até o Ribeirão; desciam o tanque do Baú, ou logradouros do Pito Aceso. Com isso, levavam muito tempo para concluir o percurso de ida e volta à cidade, ando sempre pelo muro arrombado quando iam devolver as trouxas para os moradores.
Conta-se que Siá Joaninha, uma lavadeira que morava por aquelas bandas, sempre ouvia de Sinhá Dona, sua patroa: um dia, essa sua mania de trazer roupa de noitinha lhe traría surpresas desagradáveis. Mas ela retrucava afirmando que com o rosário de Nossa Senhora na mão e a companhia do seu cachorro, Ventania, não tinha medo.

A lavadeira sempre voltava para casa por volta das 20h, um horário considerado tarde, naquela época. Foi então que em uma dessas noites, já distante de casa, o vento lhe trouxe aos ouvidos ruídos surdos de cochichos e ladainhas mal-entoadas.
Sem se intimidar, ela continuou apressando o o, mas quanto mais andava, mais alto os ruídos ficavam, como se estivesse indo de encontro ao vozeirio.
Em uma curva do caminho deu de encontro com um enterro. Todos os participantes estavam vestidos de preto e de cabeça baixa, numa toada monótona, acompanhando um caixão preto. O andar era em direção ao muro arrombado, onde entravam e sumiam mata adentro.
As pernas de Joaninha tremeram de cima abaixo e ela correu o mais rápido que pôde pra casa.
4. Tibarané 5m1073
O Tibarané se trata de um pequeno arinho encantado. A lenda conta a história de uma (ou um) indígena idosa (o) que vivia vagando pelas florestas atormentando a vida das pessoas que moram no campo.
Em uma das versões do conto, a indígena sai logo cedo em busca de fumo pela vizinhança. Bate de porta e em porta e quando atendem ela faz o pedido. Se a pessoa dá o fumo, ela apenas agradece e entra de volta para a floresta.

Porém, se a pessoa não tem fumo, ou não quis dar a ela, fica muito brava e sai correndo para as matas. Durante a noite, ela então volta em forma de pássaro, pousa em cima da cumeeira da casa e canta um piado muito forte. Segundo a crença, logo em seguida morre alguém naquela casa.
Dizem os mais antigos que nas roças perto do Rio Cuiabá, a presença dela era constante há alguns anos atrás.
Outra versão do conto diz que seria um homem, maltrapilho, que se transforma em pássaro ao anoitecer. Se alguém necessita de algo, um favor ou benefício, a pessoa deve fazer o pedido a ave enquanto ela estiver cantando, lhe prometendo comida, bebida ou fumo.
Realizado o pedido, se em alguns dias um homem estranho aparece na porta da casa, é o Tibanaré vindo buscar o pagamento.
5. A Visão 8j24
No ano de 1926, falava-se muito pelas calçadas de Cuiabá sobre uma moça bonita e simpática, muito estimada pela sociedade cuiabana, por seu gênio alegre e gentil.
Dizem que no carnaval daquele ano, ela brincou animadamente durante os três dias dedicados ao reinado do Momo. Entretanto, depois dos festejos, ela adoeceu e dentro de poucos dias, veio a falecer.
Quando ninguém mais falava da sua existência, pessoas começaram a relatar que no bairro do Porto, uma “visão” começou a aparecer para alguns foliões. Diziam ser de uma mulher vestida de branco e que o espírito ou a alma da morta, se aproximava tanto que dava para reconhecer sua fisionomia como sendo a daquela moça. Em seguida, o vulto desaparecia.
A lenda evoluiu para narrações de que a jovem, dançava em bailes de carnaval e depois, ao sair, se levava o par que lhe fez companhia na brincadeira até o portão do Cemitério da Piedade, onde se despedia, desaparecendo na madrugada, rumo as sepulturas.
6. O Pé de Garrafa 4n2w12
Diz a lenda que o Pé de Garrafa é um ser místico peculiar. Ele habita as florestas mais densas e as montanhas mais altas do estado de Mato Grosso.

Muitos que afirmam já terem visto a criatura, ou tiveram a oportunidade de conhecer alguém que já o viu o descrevem como muito alto, medindo mais de três metros de altura, e que possui um pé só, em forma de fundo de garrafa. Seu pêlo é preto e se espalha por todo o corpo, deixando branco só a parte do umbigo, onde fica o seu ponto fraco.
Dizem que ele dá gritos muito fortes que arrebentam os tímpanos de quem o escuta e vive espantando e seguindo pessoas que se aventuram pelas estradas e florestas à noite.
Normalmente grita para alguém pedindo informação sobre o caminho da mata. Aqueles que ouvem seu pedido não devem responder, pois ele costuma seguir a pessoa. Relatos afirmam que ele tem um único olho e um chifre e que para para escapar dele é necessário atingir seu umbigo branco, sua única fraqueza.
7. A Alavanca de Ouro 3r241c
Na Colina do Rosário, nas proximidades da Igreja do Rosário, apareceu aflorando da terra e despertando a cobiça de todos, uma alavanca de ouro
Todos a queriam, mas um rico português, senhor ambicioso que possuía muitos trabalhadores, a queria à todo custo. Para tê-la, ordenou que fizessem uma grande escavação no local, sob sua orientação.
No desespero pelo ouro, os homens trabalhavam sem parar sob sol e chuva. A ganância pelo ouro era tão grande que ninguém parava de trabalhar nem um minuto, e o buraco atrás da alavanca ficava cada vez mais fundo. Dessa forma, os trabalhadores estavam ficando cada vez mais nervosos e brigando entre si, nem se falavam um com o outro mais.

Certo dia, apareceu por ali um senhor bem velho que parecia estar muito cansado e com sede. Ele pediu água, mas ninguém se importou, continuaram cavando. Apenas um deles, se sentindo tocado ao ver o idoso naquela situação de sofrimento, saiu do buraco e o deu um pouco d’água. Após bebe-la com grande dificuldade, o senhor agradeceu ao trabalhador, dizendo: “Meu filho, trabalhe sempre com satisfação que seu trabalho se tornará menos penoso”.
Em seguida, a terra ao redor do buraco começou a desmoronar, enterrando vivos todos os ambiciosos que estavam à procura da alavanca, sendo que único que se salvou, foi o homem que deu água ao velhinho.
Quando as pessoas se aproximaram para ver o que aconteceu, o trabalhador estava ali de olhos arregalados contando o que aconteceu. Alguns afirmam que o velhinho seria Jesus Cristo e que por este motivo a Igreja do Rosário foi construida ali por perto.
8. A mão negra 2630j
A história é muito conhecida pela região ribeirinha da baixada cuiabana. Dizem que sob um grande barranco que havia na margem do Rio Cuiabá, morava uma idosa, muito doente que roubava peixes dos pescadores distraídos e que ela se transformava em uma enorme mão negra quando ia roubar os peixes.
Nos dias santos e feriados, sempre havia alguém pescando sobe aquele barranco. A lenda conta que certa vez, um pescador que se considerava muito esperto por não acreditar nas histórias dos mais velhos, sobre o aparecimento daquela mão misteriosa, arrumou suas coisas e foi para o ponto, com o objetivo de ar o dia e a noite pescando.

Animado, rumou para o barranco e sem perder muito tempo, colocou a isca no anzol e ficou à espera de uma fisgada. Ao meio dia, ele já tinha conseguido capturar inúmeros pescados de todos os tamanhos.
Quando ele decidiu sair para almoçar e descansar, ele decidiu dar uma espiada em sua cesta e para o espanto dele, ela estava totalmente vazia. Com medo, ele juntou rapinho as coisas mas antes de conseguir sair correndo, foi surpreendido por uma grande mão negra, emergindo à beira d’agua procurando por algo.
Ao avistar a cena ficou pálido e desesperado. Correndo como louco, acabou se enroscando em um emaranhado de cipó e ali ficou gritando até aparecer outro pescador para salvá-lo. Ele chegou à cidade em estado de choque contando o causo para os demais.
9. A Princesa Branca do Vestido Azul 1v4x2e
No tempo em que aconteceu o fato que originou a lenda, a vila de Livramento era rodeada por densos bosques, extensões de matas virgens e nas proximidades se erguiam grandes propriedades, que exibiam o poder latifundiário de antigos posseiros.
Diz a lenda que uma criança de 4 anos, encantada com a variedade de borboletas e com o canto dos pássaros que haviam por ali, entrou no bosque. Ele se distanciou tanto da própria casa que acabou se perdendo e começou a sentir medo, fome e sede. Tomado pelo desespero, ele começou a chorar e a chamar pela mãe.

Exausto, o menino se sentou à beira de um riacho onde foi surpreendido por uma linda moça de vestido azul. O conto diz que ela pegou a mão dele carinhosamente e o conduziu até o povoado.
“Se lhe perguntarem quem o trouxe aqui, diga que foi a melhor amiga de todas as mães, a Princesa Branca de Vestido Azul”, afirmou a mulher.
O retorno da criança à vila trouxe uma grande satisfação a todos da família que o procuraram pelas matas, nas correntezas dos ribeirões e mas como não o encontravam já o julgavam morto e desaparecido.
Para comemorar o grande acontecimento, os pais dele mandaram celebrar uma missa na capela da vila.
Ao entrar na igreja acompanhado dos pais e de toda a família, o menino exclamou animadíssimo:
“Olha mãe! Veja aí, a moça que me trouxe pra casa. O mesmo vestido azul, é ela!”.
Disse a criança apontando para a imagem de Nossa Senhora do Livramento, que estava sobre o altar toda enfeitada de flores

10. O Candimba 2p1r3d
Lá pelos anos 30, Candimba era um rapaz que fazia sucesso entre as jovens de Cuiaba, porém notavam que ele era um muito nervoso, principalmente com sua mãe. Após certo tempo, ele começou a maltratá-la cruelmente, não apenas com palavras mas também com pontapés.
As agressões de Candimba à mãe foram se intensificando com o tempo e a medida que mais aumentavam, ele foi mudando sua forma física. Foi se encolhendo e ficando corcunda, suas pernas iam ficando cada vez mais finas e sua cabeça adquirindo uma forma esquisita.
Quanto mais deformado ficava, mais se escondia das pessoas, não gostava do contato com ninguém, só da mãe.
Segundo relatos que corriam pelas ruas da baixada cuiabana, houve uma época em que a sua coluna ficou completamente encurvada e seus ossos à flor da pele de tanta magreza. Diziam que os dedos do rapaz tinham unhas longas e sujas, e seus cabelo embolados e embaçados, pareciam cabelos de milho.
Ele tinha apenas um único amigo que o levava para tomar sol. Quem ava e o via, acreditava ser coisa de outro mundo e as pessoas diziam que aquilo era castigo por maltratar e espancar a própria mãe.