"Madalena": assistimos ao filme rodado em MS e vamos te dar motivos para ver também 2pw1e
Filme já circulou por diversos festivais no mundo e agora está disponível em serviços de streaming ol4n
Depois de rodar por mais de 30 festivais de cinema pelo mundo – e levar prêmios – chegou nesta semana aos serviços de streaming o filme “Madalena” – que foi rodado em Mato Grosso do Sul, com parte do elenco escolhida por aqui.

Entre os “locais” está a protagonista, Pammela Yule, estreante como atriz profissional. É uma produção com temática atual e forte: a transfobia, e, embora não seja longo em duração, “Madalena” é denso, complexo, pela estética, tanto visual quanto sonora.
O Primeira Página assistiu Madalena. A gente listou, inclusive, o que tem nele que torna a produção um exercício e tanto para conhecer, por meio do cinema, um pouco mais de nós mesmos, sul-mato-grossenses, e das nossas realidades.
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Drones no ar e seriemas no meio da soja 4d60i
“Madalena” começa com demoradas tomadas de plantações de soja. No meio da lavoura, seriemas se alimentando. É tudo lento, sem narração. Só se ouve o barulho das folhas, o som do vento, dos caminhões ando à beira da rodovia. E das máquinas colheitadeiras. No céu, um balé de drones pulverizando agrotóxicos. Também tem crianças brincando de bola.
Nesse cenário, “Madalena”, uma mulher trans, aparece rapidamente, jogada sem vida no meio do mar de soja. Um corpo vestido de branco na imensidão verde.
“Os animais, a plantação de soja, a floresta, as máquinas são todos personagens importantes na história. Além de significado, eles criam tensão”, define o diretor de cinema Madiano Marchetti, mato-grossense em sua estreia no formato longa-metragem.
“Então, por exemplo, filmamos as máquinas que trabalham nos campos de soja quase como monstros, criaturas que se confundem com aquela paisagem inóspita que às vezes pode assumir um aspecto assustador. As emas, os únicos animais que parecem conseguir sobreviver naquele deserto verde de soja, têm uma narrativa própria dentro do filme, porque elas testemunham algumas coisas para além da experiência humana. Enquanto isso, a plantação de soja e a floresta são dois universos em colisão naquela paisagem”, descreve.
Campo-grandense, multiprofissional e agora protagonista de filme n5dk
Pamella Yule mora em Campo Grande desde sempre. Atua como professora, DJ e produtora cultural. Quando soube da seleção para participar de uma produção cinematográfica, candidatou-se. Conseguiu um dos papéis principais, de Bianca, transexual que, junto duas amigas, vive o luto pela tragédia com Madalena.
Chama a atenção a resignação à violência que, sabidamente, é maior no Brasil do que em qualquer lugar do mundo. Um dos trechos mais significativos do filme mostra o trio dividindo entre si o que ficou da amiga morta. Em outra cena, elas seguem a vida num banho de rio.
As três amigas compõem um dos núcleos da trama. Há ainda uma jovem desalentada com a vida de uma cidade do interior, sem perspectivas, que conhece Madalena porque ela era cliente da mãe costureira, e o jovem Cristiano, dono da plantação de soja, que vive em conflito com o pai sobre a condução dos negócios rurais. Para ele, as coisas se complicam mais quando o destino se cruza com o da vítima do assassinato transfóbico.

Cineasta premiado por obras ligadas à cultura de MS 721m2
Nascido no Rio de Janeiro, Joel Pizzini é produtor do filme junto com Marcos Pieri, Clélia Bessa, Sérgio Pedrosa, Beatriz Martins, além da produtora associada Rosan Svartman.
Pizzini mora no Rio, mas sua carreira é povoada de obras relacionadas à realidade de MS. É premiado internacionalmente com produções como “Caramujo-Flor” (1988), “Enigma de Um Dia” (1996), “Glauces” (2001) e “Dormente” (2006).
Com o documentário “500 Almas” (2004), de temática indigenista, recebeu o prêmio Melhor Pesquisa pela Fundação Rockfeller, Rio de Janeiro; Margarida de Prata pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Rio de Janeiro; Melhor Filme no Festival do Rio e Melhor Documentário Latino-Americano no Festival de Mar del Plata. A obra mais recente dele, Zimba, conta a vida de Zbigniew Ziembinski, artista sobrevivente do Hocausto, que se radicou no Brasil. Foi o derradeiro trabalho de Nicette Bruno, atriz levada pela pandemia de covid-19.
Randandandan e “sambar na soja” 342t2j
“Madalena” foi dirigido por um cineasta nascido em Mato Grosso já na borda da Amazônia, e que vive em grandes centros há bastante tempo. Mas a equipe de produção garantiu ambientação regional aos diálogos e cenas. Elas foram filmadas em Dourados, Maracaju e Bonito.
“Nunca acreditei que fosse sambar na soja”, brinca uma personagem sobre a cultura que é um dos motores do agronegócio local. “Top”, afirma um outro, em tom de exclamação, usando um neologismo muito comum por essas bandas. O trabalho em frigoríficos está citado. E até o “radandandan”, as manobras de motocicleta feitas pelos jovens, está lá, com barulho e bastante fumaça.
Tetê Espíndola cantando o Pantanal 3w4l2u
Em uma das agens mais emblemáticas da fita, na casa da ausente mas presente o tempo todo Madalena, o áudio de fundo é a voz de Tetê Espíndola falando de bichos que todo sul-mato-grossense conhece muito bem.
“Jaguatirica, lagarto, tatu, jabuti, paca, veado, cobra. Bichos que habitam aquele lugar”, canta Tetê, representante da vertente musical da família Espíndola. A canção está no álbum Piracetã, de 1980.
Tetê ganhou projeção nacional principalmente depois de “Escrito nas Estrelas” levar à vitória no “Festival dos Festivais” de 1985, da Rede Globo.
A denúncia de vidas encurtadas pela transfobia l2o3h
O tema de “Madalena” é a transfobia. A personagem que aparece morta de início, e é o fio condutor que liga os personagens, é vítima de um tipo de crime ainda comum.
Entre 2017 e 2021, relatório elaborado pela Antra (Secretaria de Articulação Política da Associação Nacional de Travestis e Transexuais) mostra que foram 10 pessoas trans mortas em Mato Grosso do Sul. É o 14º estado mais violento para essa população no País.
Uma das vítimas foi achada em meio a um milharal, situação de fato que evidencia: a ficção de “Madalena” se espelha na realidade.”