A história de Luana, a leoa que foi pet de família em Campo Grande t4b5c
Leoa foi pega ainda bebê por família dona de parque de diversões que funcionou durante 30 anos em Campo Grande, na década de 1980, e foi objeto de série de reportagens da seção "Memória Afetiva" do Primeira Página 54446
A busca do Primeira Página pelos rastros de memória do Parque de Diversões Imperial, objeto da série “Memória Afetiva”, levou à descoberta de uma agem bastante peculiar envolvendo os donos do lugar. Em 1987, a família Alvim Pereira criava um filhote de leão, numa chácara localizada na saída para Três Lagoas, em Campo Grande.

Isso mesmo! Um exemplar do segundo maior felino do reino animal era um dos pets da família. Chama-se Luana e ficou pelo menos seis meses morando na chácara, até ser descoberta pela vizinhança.
A fêmea era mantida em um canil. Se alimentava de carne moída e arroz.
Não foi possível localizar uma única foto que seja de Luana e por isso, vamos ficar com as ilustrações da inteligência artificial e a capacidade de imaginação, é claro.
Segundo os relatos obtidos pela reportagem, o bicho chegou a caminhar pelas ruas do conjunto habitacional em mais de uma oportunidade, depois de escapar de seu alojamento, provocando pavor nas pessoas, como é de se imaginar.
Predador 431m3x
O mamífero carnívoro está no topo da cadeia alimentar e é um dos maiores predadores da natureza. Quem garantia que não poderia atacar as pessoas? Os rugidos eram ouvidos à distância, à medida em que ela foi crescendo.
Diante disso, Luana virou caso de polícia e justiça. Vizinhos chamaram os bombeiros e depois a Polícia Civil baixou na casa.
Numa primeira situação com o animal à solta, os bombeiros foram acionados para dominá-lo.
Em uma segunda ocasião, foram deslocadas equipes do Corpo de Bombeiros e ainda um agente de defesa florestal do IBDF (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal), o órgão nacional de proteção ambiental de então.
Esse servidor público revelou uma cena de medo entre os moradores e muita dificuldade para captura do animal, mesmo usando um sedativo.
Precisou de um intervalo de tempo de seis horas para cumprir a tarefa.

“Os componentes da guarnição de salvamento tiveram grande trabalho para dominar o leão ou leoa, inclusive o depoente após assumir o comando da diligência também teve grande dificuldade para aplicar o anestésico no citado animal, tanto que a diligência iniciou-se por volta das 11h e somente às 18h é que o animal foi dominado”.
Trecho de processo judicial
Captura difícil 394n5f
Depois disso, a Polícia Civil entrou na história. Foi expedido um mandado de busca e apreensão da leoa.
Pelas informações levantadas, ela estava com a família desde recém-nascida. Para confirmar se tratar de um filhote de Panthera leo – nome científico da espécie – dois médicos veterinários foram chamados ao Núcleo de Ciências Veterinárias da FUFMS (Federação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), para onde a felina foi levada.
“O referido animal com idade inferior a um ano e de pelagem castanha, se apresentou extremamente agressivo no momento do exame e se encontrava em jaula de ferro. Pela inspeção, verificou-se que o animal apresentava um estado sanitário razoável, demonstrando no entanto, alguns sinais com patíveis com alimentação inadequada”.
Termo de declaração de veterinários anexado a processo

Retirado o filhote da família, iniciou-se um processo judicial e, paralelamente, uma caçada por local adequado para abrigar Luana.
Entrou no circuito até o secretário de Meio Ambiente da época, Harry Amorim Costa – político bastante conhecido por ter sido o primeiro governador de Mato Grosso do Sul.
Ofício endereçado a ele pelo delegado responsável pelo inquérito, Marcos Santos, pede a indicação de um espaço para abrigar a bebê leoa.
Na época, existia uma função estadual chamada “Zoológico Já”, planejada para a guarda e manutenção de animais, também procurada. A resposta foi negativa. A instituição, apesar de seu objetivo, informou não dispor de estrutura para manejar um bicho daqueles.
Um espaço de Jundiaí, em São Paulo, chegou a aceitar ficar com o animal. No fim das contas, porém, a leoa foi levada para Ivinhema, único município sul-mato-grossense onde há existiu um zoológico.
O Primeira Página tentou rastrear a agem da leoa por Ivinhema. Diante do tempo ado, nenhum dos responsáveis pelo zoológico à época foi encontrado.
No ano de 2006, o parque foi fechado pelo Ibama, diante da proibição desse tipo de atração no país, com a criação de leis ambientais mais restritivas.
Até o ano de 2011, ainda havia um leão em Ivinhema, chamado Simba. Naquele ano, ele foi transferido para o “Rancho dos Gnomos”, em uma operação que virou notícia nacional.
Veja o leão Simba no vídeo abaixo: 58205u
Os leões, segundo a pesquisa feita pelo Primeira Página, vivem até dez anos na natureza. Em cativeiro, conforme informação do portal Mundo Ecologia, podem chegar até 25 anos. São encontrados nos tempos atuais em parte da África e na Índia, onde foi preciso criar parque específico para preservação da espécie, constantemente ameaçada de extinção pela ação do homem.
“Fiquei chateada” 314h4a
Ednei Pereira, a viúva do criador do Parque de Diversões Imperial, Eloy Alvim Pereira, contou que o marido viajava muito e das viagens trouxe o filhotinho de leão para casa. Possivelmente, era proveniente de um circo, como era comum.
Segundo ela, Luana era mansa, e vivia “entre os cachorros”.

Ednei lembra de ter ficado brava quando os vizinhos denunciaram a presença do animal e ele acabou sendo levado da chácara. itiu ter resistido quando os bombeiros chegaram para a busca.
“Essa leoa foi criada igual cachorro, nunca atacou ninguém”.
Ednei Pereira
A pretensão, disse, era de doar o felino para um zoológico, o que acabou sendo frustrado pela ação dos moradores do bairro.
“Eu fiquei braba, fiquei muito chateada”.
O que aconteceu na Justiça? 62556s
Você deve ter feito essa indagação desde o início do texto. Nós da reportagem também a partir do momento no qual topamos com esse episódio de quase quarenta anos atrás, durante os levantamentos sobre o Parque de Diversões Imperial.
Por isso, fomos atrás dos resultados do processo aberto contra Eloy e Ednei, o casal identificado como proprietários do animal, que era também dono do espaço de lazer tratado na série “Memória Afetiva”.
Depois do inquérito da Polícia Civil, iniciou-se um processo, que terminou com a absolvição dos dois.
“Cremos na não existência da contravenção, nem no seu aspecto subjetivo, em toda sua plenitude, tampouco em seu aspecto objetivo. Não houve violação de nenhuma ordem penal, e se houve, o fora da ordem istrativa ou regulamentar, ou seja, possuir o guardatário do animal, sem autorização do órgão competente, insciente para exteriorizar delito ou contravenção”
Manifestação do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), responsável pela acusação.
Diante do entendimento da promotoria, o juiz do caso, Sideni Soncini Pimentel, livrou o casal de qualquer punição, inclusive do pagamento das custas pelo andamento do caso na Justiça.
Na legislação vigente, o fato havia sido enquadrado em duas modalidades de contravenção penal, uma prevista na lei de proteção à fauna, de 1967, e outra na lei geral de contravenções penais, de 1941.
O Primeira Página conversou com o desembargador Sideni, hoje desembargador e vice-presidente do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), e ele explicou que, na época, a absolvição foi o desfecho adequado às leis em uso.
Esse foi um dos primeiros casos assumidos pelo magistrado quando chegou em Campo Grande, vindo do interior.
Confira abaixo no vídeo o que o magistrado disse: 585v6u
Nas regras contemporâneas, uma atitude desse tipo seria crime ambiental e infração istrativa ível de multa. A lei nesse sentido foi criada em 1988, mesmo ano da sentença do caso relatado nesta reportagem.
Este foi um capítulo extra da série que inaugurou a seção “Memória Afetiva” do Primeira Página.
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