Verônica e a Irmã Morte. Ou vice-versa 2a706l
Freira espanhola garante boa opção de sessão dupla no feriado prolongado do dia dos mortos 6c691a
Em tempos de considerar freiras como objetos do terror, o espanhol Paco Plaza faz um competente trabalho.
Em 2017, dirigiu Verônica. Agora, lança uma prequel – filme que narra eventos anteriores – chamado Irmã Morte.
Quem assistiu à Verônica teve oportunidade de sentir um misto de drama e medo com a protagonista de mesmo nome.
Aos 15 anos de idade, a estudante tem uma vida pesada. Cuida dos três irmãos menores e da casa para que a mãe possa trabalhar até tarde da noite num bar.
É comovente ver a responsabilidade que recai sobre uma menina que olha pela janela do apartamento e vê, numa vizinha desconhecida, a adolescente que queria ser, cantando na varanda, recebendo carinho do pai, namorando.
O fardo de Verônica é pesado demais.
Então, um dia, ela resolve comprar, numa banca, uma série em fascículos sobre ocultismo. Ela está interessada no brinde: um tabuleiro de Ouija.
É aquele jogo em que, com os dedos sobre um copo, você consegue conversar com espíritos que responde “sim”, “não’ ou soletram palavras através de letras espalhadas no tabuleiro.
Duas amigas da escola topam participar. Uma, por pura atração adolescente pelo perigo. A outra, pra tentar ar o namorado, morto num acidente de moto.
Verônica quer falar com o espírito do pai. O vazio que a mãe, atarefada, não consegue preencher.
Num dia de eclipse solar, enquanto toda a escola sobe para a cobertura para assistir ao fenômeno, o trio desce até o porão escuro e cheio de badulaques sem uso para falar com o além-túmulo.
A partir daí, uma entidade maligna a a acompanhar a menina.
Abandonada pelas amigas, sem apoio da mãe, Verônica, sozinha, precisa lidar com a situação. E não há heroísmo. Ela não tem superpoderes.
O mérito de Paco Plaza é mostrar o que, provavelmente, uma adolescente nesta situação faria.
Mesmo que isso fosse uma nova mancada. Afinal, ela tem só 15 anos!
As cenas são muito convincentes. As crianças, que confiam fielmente na irmã quase mãe, mesmo com medo de Verônica, ainda se agarram a ela em busca de apoio.
Um filme de terror que tem sustos, causa medo e ainda explora a camada da responsabilização prematura.
Uma adolescente precisa ser cuidada, não cuidar.
O mal sabe disso. O mal segue sempre à espreita. Só aguardando um tabuleiro para entrar no jogo.
Mas e a freira nessa história?
Em Verônica, a irmã Morte – na verdade, irmã Narcisa – é uma ex-professora do colégio. Ela é cega, mas vê o sobrenatural. É quem ajuda – superficialmente, é verdade — a menina a enfrentar a criatura.
Uma personagem forte. Assustadora, até. Mas que não foi explorada no filme.
Então, a ideia de contar a história dessa mulher surgiu.
Se o Invocaverso conseguiu fazer muito dinheiro com A Freira, por que não faturar com mais um filme de terror tendo como cenário a penumbra de um mosteiro e mulheres de hábito com hábitos misteriosos?

Irmã Morte, que estreou na Netflix, mesma plataforma de Verôncia, começa em preto e branco, com imagens de uma menininha olhando para o céu em adoração.
Narcisa, em 1939, era a Menina Santa de Peroblasco, com a capacidade de enxergar Santa Maria.
Dez anos depois, ela é uma noviça, uma aspirante à freira.
Professora, vai dar aulas num colégio de freiras para crianças em situação de vulnerabilidade.
Ali, ela deverá fazer os votos para ser esposa de Jesus e se entregar à vida religiosa.
Mas tudo o que ou na infância – olha a responsabilidade precoce aí de novo! – tendo de abençoar centenas de fiéis que a cercavam em busca de algum tipo de salvação, deixam sua fé em xeque.
Tudo é dúvida na cabeça de Narcisa.

E os personagens secundários ajudam demais nessa atmosfera. A freira invejosa, a diretora fascinada por ter uma santa, uma freira cozinheira assustadora. Um padre bem estranho que só aparece quando ela entra no confessionário. E crianças com segredos.
Se em Verônica, o jogo era o tabuleiro de Ouija. Aqui, é a forca. Rabiscada na parede do quarto, ela envolve uma maldição que recai sobre a escola.
Uma escola que foi, anteriormente, um convento vitimado por uma invasão durante a guerra espanhola.
A trama se desenrola de forma envolvente. Paco se utiliza do batido recurso de esconder as cenas de terror em sonhos da protagonista.
Confesso que isso me irritou um pouco.
Mas nada quem me impediu de continuar na exibição.
E que bom.
O filme caminha para um desfecho surpreendente.
E competente.
Mais uma vez, crianças são envolvidas na história e uma pessoa com a responsabilidade que não precisaria ter se vê em papel de salvadora.
Papel que funciona bem com super-heróis.
Narcisa e Verônica são apenas humanas.
As consequências são inevitáveis.
Assim como o desejo de assistir um na sequência do outro. Sem importar a ordem.
Verônica e a irmã morte. Ou vice-versa. A Irmã Morte e Verônica.
Dois filmes para reforçar a fé.
De que as freiras ainda podem render muito no cinema.
Que Deus nos perdoe.