Alienação Parental: a saga de uma mãe para recuperar a filha – parte 1 2w5w39

Eu não fazia a menor ideia até onde pode o amor por uma filha ser transformado num instrumento do ódio pela mãe 4r6a1p

Era domingo de carnaval, dia 19 de fevereiro, quando recebi uma mensagem de uma amiga, advogada, perguntando se eu havia viajado. Disse que não. Então ela me falou: você tem trabalho. Eu não fazia a menor ideia naquele momento de como seriam difíceis as próximas duas semanas, e até onde pode o amor por uma filha ser transformado num instrumento do ódio contra a mãe. Preparem-se para conhecer a pior face da alienação parental.

Minha amiga não falou muito sobre o caso ao telefone, de modo que eu estava descontraído quando cheguei ao meu escritório na manhã daquele domingo. Dei um “bom dia” sorrindo, e assim também fui recebido, com cordialidade, mas apenas porque ela, que viria a ser minha mais nova cliente, é uma pessoa muito educada. Não havia felicidade no coração daquela mulher que explicasse qualquer sorriso, como também não havia nada de bom naquele dia ensolarado de domingo.

Janaína divorciou-se há cerca de 9 anos. Tanto para ela quanto para ex-marido, Gustavo, Maria Clara foi o melhor fruto desse relacionamento. Ambos a amam. Mas como Janaína e Maria Clara moram em outro Estado, a criança a a maior parte do tempo com a mãe, que tem a guarda unilateral.

Na segunda metade das férias de dezembro, Gustavo foi buscar Maria Clara, assumindo o compromisso de devolvê-la antes do início das aulas. Tudo estava indo bem. No início de fevereiro, a mãe veio a Campo Grande, conforme tinham combinado, para pegar Maria Clara. Até aquele momento ela falava diariamente com a filha, pelo celular.

Depois que a mãe chegou a Campo Grande, algo aconteceu. Não conseguiu mais falar com a filha. Foi à casa de Gustavo e ninguém estava lá. Ele também deixou de atendê-la. Sumiram.

Janaína então ou a ligar para todo mundo que pudesse ter alguma informação: amigos, familiares e colegas de trabalho de Gustavo. Nada. Ele estava de licença médica no trabalho. Aliás, ele é um agente da segurança pública, um policial.

Ela conta que por dois dias ficou completamente desorientada. Tudo de ruim ava pela cabeça e começou a pensar que nunca mais veria a pequena Maria Clara. A facilidade com que Gustavo podia atravessar a fronteira do Paraguai foi seu maior tormento.

Para ajudar Janaína, sua irmã, Daiana, veio para Campo Grande também. Sorte que estava de férias do emprego, mas deixou o maridão cuidando das crianças, inclusive de uma pequenina de 2 anos.

Até aquele domingo, quem estava cuidando do caso era um advogado de São Paulo, que já prestava serviço para Janaína. Ele havia ingressado com um pedido de busca e apreensão de Maria Clara, aqui em Campo Grande, e a juíza havia deferido o pedido. Assim, já havia um mandado de busca e apreensão da criança quando eu entrei no caso.

Só que o oficial de justiça também não encontrou Gustavo, nem Maria Clara. Muito diligente, ele chegou a ir à chefia de Gustavo. Agindo de modo irretocável, como deve se esperar de um agente da lei, o chefe telefonou a Gustavo e calmamente tentou trazê-lo à razão. Gustavo, no entanto, não deu ouvidos. Ao que parece, foi até mal-educado.

Na verdade, ele confiava numa decisão liminar que conseguira junto ao Poder Judiciário aqui em Campo Grande. Gustavo entrou com um pedido de modificação de guarda. Acontece que, para fazer a ação tramitar na Comarca de Campo Grande, o advogado dele informou que a mãe “podia ser encontrada” na Avenida Mato Grosso, nº ABC, que era o endereço do hotel onde a mãe estava hospedada. Ele deveria ter informado, pela lei, o endereço do domicílio da mãe, mas isso faria com que o processo tramitasse na Comarca do domicílio dela, e não aqui em Campo Grande.

Mas esse tipo de “manobra”, além de não ser ética, tem pernas curtas. Tanto que o próprio advogado precisou juntar no processo documentos que comprovam que Janaína mora em outro Estado, e não em Campo Grande. Confiava, eu imagino, que não seriam lidos pelo juiz nesse primeiro momento do processo. De fato, não foram lidos.

Muito astutamente, antes de ingressar com o processo, Gustavo foi à delegacia para registrar um boletim de ocorrência de maus-tratos. Nele, Maria Clara relata um único episódio, que teria ocorrido em outubro de 2022, quando foi contida pela mãe, que segurou seus braços e tapou sua boca [por um instante, para que parasse de gritar], dando-lhe ainda um tapa no braço direito, sem deixar marca visível, segundo consta no B.O.

Também juntaram no processo um contrato de financiamento de um apartamento em Portugal e outro contrato de trabalho, também naquele país, para comprovar a alegação de que a mãe estaria pretendendo fugir do país com a criança. Ocorre que ninguém consegue embarcar uma criança num voo internacional se não tiver uma autorização específica concedida pelo outro pai, ou mãe, ou pelo juiz da infância.

Contudo, o principal documento que deveria ter sido juntado ao processo era a sentença anterior que concedeu a guarda unilateral à mãe. Isso para comprovar que a guarda estava somente com ela por causa de um acordo, e não porque pudesse o pai oferecer algum risco à criança. Imagine-se se a sentença tivesse retirado a guarda do pai porque havia cometido violência contra a filha? Como o juiz poderia saber disso sem lê-la?

Pois acreditem meus caros amigos e amigas, sem ouvir a mãe, o juiz decidiu que “considerando a vontade do pai em ter a guarda, concedo parcialmente a tutela de urgência, para que a guarda e a ser compartilhada entre os pais, permanecendo, no mais, o que foi acertado na sentença judicial anterior”.

Na verdade, o juiz alterou o regime de guarda, que era unilateral e estava com a mãe, para guarda compartilha, apenas em razão da “vontade do pai”, porque ele não sabia o que havia sido “acertado na sentença judicial anterior”, que não estava no processo.

Essa decisão foi realmente muito estranha, porque a própria lei diz que é prudente ouvir ambos os pais antes de decidir alterar a guarda que foi estabelecida. Lógico, se há provas concretas de que um deles oferece risco à criança, a situação a a justificar uma decisão liminar. Mas não era o caso, e a existência de qualquer perigo não foi citada na decisão do juiz, de modo que o fundamento da decisão liminar realmente foi somente a “vontade do pai”.

E que estrago Gustavo fez na posse dessa decisão! Sentiu-se protegido! Poderoso! Tão poderoso que viajou para uma cidade do interior de Mato Grosso do Sul, a 450 km da capital, para ar uma temporada na casa do atual sogro.

Janaína descobriu e avisou a Polícia Civil, que a essa altura havia sido acionada para cumprir o mandado de busca. Numa atuação exemplar, Polícia Civil da localidade foi acionada e prontamente conseguiu localizar Gustavo, conduzindo-o à delegacia para prestar depoimento. Sem aquela decisão liminar de guarda compartilhada, Gustavo estaria cometendo o crime de subtração de incapaz, e poderia até mesmo ser preso em flagrante. Mas ele sabia que estava amparado.

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Que bom, para Gustavo, que o juiz não viu que os contratos juntados no processo para comprovar que Janaína estava para “fugir” para Portugal mostravam que ela mora em outro Estado. Que bom, para Gustavo, que o juiz manteve, no mais, “a sentença judicial anterior”, mesmo que ela não tivesse sido juntada. Enfim, que bom, para Gustavo, que o juiz não viu o que estava nos autos, embora tenha conseguido ver até o que não estava nos autos!

Ao ser perguntado pela própria delegada de Polícia sobre onde estava sua filha, Gustavo respondeu: não estou com ela há dez dias. Ela está em Campo Grande, na casa de terceiros, mas não vou dizer onde.

Imagino que um pequeno silêncio tenha se feito presente naquele momento. O que poderia a delegada fazer, afinal, ele tinha a guarda compartilhada?

Isso aconteceu no sábado, dia 25 de fevereiro, à noite. Fui saber já eram 20 horas. Naquele momento, confesso, o pior ou pela minha cabeça. Quem trabalha na Justiça conhece o melhor e o pior do ser humano.

Não tive coragem de dar a notícia por telefone. Chamei a mãe até minha residência, para que ela pudesse ouvir aquilo sentada e com um copo de água na mão, ao lado da irmã.

No sábado próximo você saberá o que aconteceu na segunda semana dessa saga, e como ela terminou. Provavelmente haverá um terceiro texto para tratarmos de conceitos mais gerais de alienação parental e da legislação sobre o tema.

Uma observação: os nomes citados são fictícios.

Até mais.

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